08/09/2015
Florianópolis atende população da periferia com Mais Médicos
Nos grandes centros urbanos, onde há uma tendência maior de concentração de médicos, também existem áreas mais vulneráveis, que sofrem para atrair e reter profissionais de saúde no sistema público. Exemplo disso é Florianópolis, capital catarinense e um dos principais cartões postais do país. Mesmo com uma ampla cobertura oferecida no sistema público de saúde, a cidade convivia com a baixa fixação de médicos em algumas áreas da periferia, e para solucionar o problema contou com ajuda do Programa Mais Médicos.
Com aproximadamente 460 mil habitantes, Floripa é a capital brasileira com maior pontuação no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) e hoje comemora a marca de primeira capital do país a atingir 100% de cobertura na atenção básica. Até julho de 2013, a cidade já apresentava 93% de cobertura na Estratégia Saúde da Família, porém, como muitos outros municípios brasileiros, também enfrentava dificuldades para conseguir profissionais de saúde que atuassem em algumas comunidades mais vulneráveis. Aos poucos, isso foi se modificando, com a adesão ao Mias Médicos e com o desenvolvimento de ações locais ligadas à formação médica. Desde 2014, o município investe em um programa de residência em Medicina de Família e Comunidade e multiprofissional em Saúde da Família, com objetivo de formar profissionais para atender a região.
Segundo a Secretaria de Saúde de Florianópolis, a adesão ao Mais Médicos ajudou a suprir as necessidades em equipes de Saúde da Família que tinham baixa fixação de médicos, mas não é só isso. “Para além do provimento, a importância do programa está nas mudanças na formação médica, em especial na residência. A existência de profissionais com formação adequada para atuação na Atenção Primária é primordial. Nesse sentido, o Mais Médicos pode ser um grande ganho não só para o sistema de saúde de nosso município, mas para todo o SUS”, afirma o secretário-adjunto de Saúde, Nulvio Lermen Junior.
Com tudo isso, os bons resultados são consequência natural. No município, mais de 90% das equipes de Saúde da Família foram avaliadas como acima ou muito acima da média nacional pelo Programa de Melhoria do Acesso e da Qualidade na Atenção Básica (PMAQ) do Ministério da Saúde. Além disso, Florianópolis apresenta taxa de 19,9% de internações por condições sensíveis à atenção básica (19,96%), bem abaixo da média nacional, que é de 33,2%.
Médicos do programa levam mais saúde à Vila Aparecida
Florianópolis conta com 14 médicos do programa, que atuam em parte das 128 equipes de Saúde da Família existentes na cidade. Todos eles estão alocados em comunidades de difícil acesso, com alta vulnerabilidade social ou grande densidade demográfica. É o caso da Vila Aparecida, bairro com cerca de 3 mil moradores, localizado na periferia da capital, a cinco quilômetros do Centro. Devido ao alto índice de violência, era muito difícil conseguir profissionais que se fixassem na comunidade. “Tivemos médicos que ficaram de dois a três anos aqui, mas quando eles saíam, era difícil substituir”, afirma Cilane Bauer, coordenadora da Unidade Básica de Saúde (UBS) instalada no bairro.
Segundo a coordenadora, a comunidade hoje é plenamente atendida por duas equipes de Saúde da Família, das quais fazem parte dois médicos do Mais Médicos. Maikel Rodriguez Alfonso (32) e Erenia Triana Aguiar (30) – casal de médicos cubanos – estão na UBS de Vila Aparecida desde março de 2014 e se sentem bem adaptados. “Pensávamos que fosse ser mais difícil. Nos adaptamos bem a eles e eles a nós”, comenta Erenia sobre seus pacientes. “Estou muito contente com o trabalho deles. Um bom atendimento, o pessoal adora”, confirma Cilane.
Mais consultas e visitas domiciliares para a população
Ao todo, Erenia e Maikel atendem, em média, 60 pacientes por dia e realizam visitas domiciliares duas vezes por semana. O supervisor do Mais Médicos, Marcelo Coltro, conta que os médicos conseguiram territorializar a comunidade, ou seja, todas as famílias foram identificadas por endereço, permitindo a distribuição da população em dois grupos, atendidos pelas duas equipes da UBS. “Passaram a fazer visitas domiciliares, o que antes não ocorria no bairro. A figura dos profissionais de saúde é presente na comunidade”, afirma Coltro. Segundo o supervisor, a atuação dos médicos trouxe uma ampliação de 100% na cobertura de pré-natal no bairro, o que contribuiu para a redução da mortalidade materna e infantil no município. De acordo com a médica cubana, são identificadas na UBS duas a três gestações por semana.
Adaptação à realidade local com o gostinho da terra natal
Faz pouco tempo, Erenia e Maikel se mudaram do bairro Pantanal para o Abraão, mais próximo à Vila Aparecida. “Vamos e voltamos a pé, meia hora de caminhada todos os dias”, diz a médica, que atua de segunda a quinta-feira em horário integral. Maikel tira folga às quintas-feiras. “Desse modo, de segunda a sexta-feira, o posto fica sempre com médico”, explica.
Nos dias em que não estão na unidade básica de saúde, os médicos participam das atividades de especialização em Medicina Geral de Família e Comunidade (MGFC) promovidas pelo Mais Médicos. O curso é coordenado pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) por meio da Universidade Aberta do SUS (UNA-SUS). Com conteúdos teóricos presenciais e a distância, e tarefas integradas com as realizadas na UBS, os médicos estudam os casos reais identificados na comunidade onde atuam e desenvolvem iniciativas para intervenção junto a seus pacientes.
Nem o clima, nem os costumes trouxeram dificuldades ao casal. Erenia conta que o inverno de 2014 não foi tão rigoroso e as temperaturas se assemelharam às da ilha caribenha. Mesmo a alimentação conserva similaridades entre os dois povos, o que não a impede de falar com entusiasmo sobre um dos pratos típicos de sua terra natal. “Cozinho igual como se estivesse em Cuba. Quando trazemos o almoço, todos perguntam se é o congri. Aqui nunca viram isso”, conta Erenia, referindo-se a um dos pratos mais tradicionais da culinária cubana. A iguaria consiste no arroz que é cozinhado com feijão e é servido de forma levemente ressecada.
O mais difícil é a saudade
A adaptação à nova realidade em um outro país não é tão complicada para Erenia e Maikel, mas há um desafio ao qual não se acostumam. Quando veio para o Brasil, o casal deixou em Cuba sua filha, Emily, de nove anos, que vive com a avó materna. Segundo a médica essa é a parte mais difícil da missão. Os pais se comunicam com a filha todos os dias para amenizar a distância. Quando perguntada se Emily entende o trabalho que seus pais realizam aqui no Brasil, com um sorriso de saudade, Erenia responde em bom espanhol: “Ella nos dio permiso para venir”.
Fotos: Petra Mafalda/PMF
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